28/10/2009

Questões de resposta orientada

1.  (...) apesar de todas as questões filosóficas dizerem respeito a todos os homens, nem todos os homens se tornam filósofos. Por diversos motivos, a maior parte está preso de tal forma ao quotidiano que o espanto perante a vida é muito escasso (...) ofereço-te este curso de Filosofia, para prevenir. Não quero que tu pertenças à categoria dos apáticos e dos indiferentes. Quero que vivas a tua vida de modo consciente.
Jostein Gaarder, O Mundo de Sofia, Editorial Presença




A partir de uma explicação do sentido do texto, estabeleça uma relação com a “Alegoria da Caverna” de Platão.




        2.   “ Não basta conhecer as obras dos filósofos para ser filósofo. O que caracteriza um filósofo é o auto-uso da sua própria razão. O filósofo é, portanto, o que não se demite de pensar, de ter as suas próprias ideias sobre os diferentes problemas com que na vida se depara. Podemos, por isso, dizer que um aprendiz de filósofo deve começar por criar um espírito filosófico.” Texto adaptado
Explique o sentido do texto, tendo em conta os seguintes aspectos:


  • - definição de filosofia
  • - características da filosofia
  • - distinção entre atitude filosófica e atitude não filosófica




          3. Leia o texto da Alegoria da caverna (páginas 22,23 e 24 do manual) e construa um texto no qual explique de que modo este texto de Platão nos ajuda a perceber os seguintes aspectos:

  • - A relação entre realidade e aparência;
  • - A relação entre atitude de senso comum e atitude filosófica;
  • - O movimento de saída da caverna como metáfora da actividade filosófica;
  • - A missão do filósofo na sociedade.

Questões de resposta curta

  1. Defina o conceito de “proposição”.
  2. Mostre a relação entre problemas, teorias e argumentos, no que concerne à actividade filosófica.
  3. Sendo um estudo conceptual a filosofia não atribui importância às informações empíricas. Esta afirmação é verdadeira? Justifique.
  4. Não podemos definir a Filosofia mas podemos distingui-la dos outros saberes através do seu objecto e do seu método de estudo. Quais são?
  5. Sabemos que a filosofia é um estudo a priori, isto é, faz-se exclusivamente com o pensamento. Isto quer dizer que a filosofia não utiliza informação sobre o mundo dada pela experiência? Justifique.
  6. Identifique nas questões que se seguem, as filosóficas e as não filosóficas. Justifique.                          a) O que é o conhecimento? b) O que caracteriza os vertebrados? c) O que é um planeta? d) O aborto é moralmente aceitável?
  7. O conjunto de frases apresentado é um argumento? Porquê? Se a pobreza existe, a distribuição de bens essenciais está mal feita; mas é um facto que existe pobreza; por isso a distribuição de bens essenciais está mal feita.
  8. Não podemos confundir problemas filosóficos com problemas não-filosóficos. Como reconhece os problemas filosóficos? Justifique com dois exemplos de cada.
  9. Qual é, afinal, a importância de estudar filosofia? Exponha, de forma clara, as razões que justificam, ou não, o valor e utilidade da filosofia.

Questões de verdadeiro/falso

Leia com atenção as seguintes afirmações e decida se são verdadeiras ou falsas:
  1. A Filosofia não está sujeita ao desenvolvimento que as dúvidas e os condicionalismos da história apontam.
  2. O filósofo ousa pensar por si mesmo, mas o pensamento filosófico não surge a partir do nada, alheio à tradição e ao contexto social e cultural.
  3. Uma das características da filosofia é a universalidade, uma vez que se trata de um saber que interessa a todos os seres humanos e todos são filósofos.
  4. O filósofo trabalha no laboratório da mente, de forma conceptual; logo, a filosofia não é a priori.
  5. À área da filosofia que estuda os valores chamamos de Axiologia.
  6. A Metafísica é a área da filosofia que se interroga obre a origem, limites e justificação das nossas crenças, perguntando por exemplo “o que é o conhecimento?”.
  7. A Lógica é a disciplina que define as regras pelas quais se deve reger o pensamento humano no sentido de ser tornar válido.
  8. A Ética é o ramo da Filosofia que se dedica ao estudo do modo como devemos agir, das razões pelas quais consideramos uma acção boa ou má e procura responder ao problema de saber como devemos viver.
  9. As questões filosóficas têm origem na nossa curiosidade, no desejo que todos temos de saber mais acerca da realidade.
  10. As questões filosóficas têm origem nos problemas que surgem na nossa vida social e cultural.
  11. As questões filosóficas surgem em pessoas que normalmente são dogmáticas.
  12. As questões filosóficas surgiram todas na Grécia Antiga, com os primeiros filósofos.

Atitude filosófica versus atitude de senso comum

«Para as crianças, o mundo – e tudo o que existe nele – é uma coisa nova, uma coisa que provoca estupefacção. Os adultos não o vêem assim. A maior parte dos adultos vê o mundo como qualquer coisa completamente normal.
Os filósofos constituem uma excepção notável. Um filósofo nunca se conseguiu habituar completamente ao mundo. Para um filósofo ou para uma filósofa o mundo é ainda incompreensível, inclusivamente enigmático e misterioso. Os filósofos e as crianças pequenas possuem uma importante qualidade em comum. Podes dizer que um filósofo permanece durante toda a sua vida tão capaz de se surpreender como uma criança pequena.
E agora tens que decidir, […] és uma criança que ainda não se habituou ao mundo? Ou és um filósofo que pode jurar que isso nunca lhe acontecerá?
Se simplesmente abanas a cabeça e não te sentes nem como criança nem como filósofa, é porque te acostumaste tão bem ao mundo que este já não te surpreende. Nesse caso, o perigo está iminente. E por isso te ofereço este curso de filosofia, para prevenir. Não quero que pertenças à categoria dos apáticos e dos indiferentes. Quero que vivas a tua vida de modo consciente.»
Jostein Gaarder, O mundo de Sofia, p. 23


1.       Retire frases do texto que nos permitam caracterizar a atitude filosófica e o senso comum.
2.       Distinga, a partir do texto, atitude filosófica de senso comum.

Alegoria da Caverna

Etimologicamente, o grego allegoría significa “dizer o outro”, “dizer alguma coisa diferente do sentido literal” (allos, “outro”, e agoreuein, “falar em público”).
Uma alegoria é uma representação tal que transmite um outro siginificado em adição ao significado literal do texto. Em outras palavras, é uma coisa que é dita para dar a noção de outra, normalmente por meio de alguma ilacção moral.
Representação da Alegoria da Caverna:

Como é que a alegoria da caverna nos ajuda a perceber o que é a Filosofia?

 §  Apesar de não haver uma definição unívoca de filosofia, é possível encontrar pontos comuns nas definições avançadas pelos diversos filósofos e pensadores “O que é a Filosofia?”. 
Filosofar é:
- ser crítico em relação à realidade;
- ir para além das aparências;
- querer saber as respostas à questões fundamentais sobre a vida, sobre o ser humano;
- questionar o que habitualmente se aceita como normal, evidente, inquestionável.


§  A Alegoria da Caverna de Platão fornece-nos simultaneamente um retrato do modo como a filosofia actua em nós, e uma ideia sobre a sua própria visão filosófica do mundo.




Interior da caverna

 Interpretação literal: Trevas
 Interpretação metafórica: sombras, aparência, 
 ilusão – imitação da realidade
 Ignorância, inconsciência, opinião (doxa), preconceitos, crenças, ideias não fundamentadas, não sustentadas por argumentos
 Equivale ao senso comum
 Mundo da aparência, mundo sensível*

Exterior da caverna

Interpretação literal: Sol, luz, objectos reais
Interpretação metafórica:
Mundo real, da verdade, do conhecimento, da consciência.
Mundo inteligível*
 * Platão distinguia entre mundo sensível e mundo inteligível e defendia que, para alcançar o saber acerca da realidade não nos podíamos ficar por aquilo que os sentidos não dão. Sabendo que os sentidos nos enganam, ou que nos dão uma visão insuficiente da realidade, é preciso ir para além dos sentidos, é preciso usar a nossa razão, isto é, a parte inteligível, para aceder ao verdadeiro saber acerca do mundo.



Na Alegoria da Caverna, Platão descreve dois movimentos:

1º De dentro da caverna para fora da caverna
Este movimento pode ser entendido como o caminho da Filosofia, a busca do saber, em que se usa a crítica, a reflexão como meios para atingir o saber acerca das coisas. Tal como é exemplificado por Platão nos seus diálogos socráticos, essa crítica e reflexão podem ser fomentadas pelo método socrático, cujo objectivo principal é conduzindo-nos ao reconhecimento da própria ignorância. A partir de sequências de pergunta-resposta, tenta mostrar-se aos interlocutores que os valores em que eles baseiam a sua vida estão cheios de problemas, incoerências e contradições. De acordo com Platão, só depois, dessa primeira fase de destruição dos preconceitos é que estaremos prontos para partir para a investigação acerca dos vários problemas filosóficos.
2º Regresso ao interior da caverna
Uma vez adquirida a consciência sobre determinados aspectos da realidade, é impossível voltar atrás, é impossível voltar à inconsciência. No entanto, é pensável o regresso ao mundo da aparência e da ilusão para libertar os que ainda estão mergulhados nela, para os conduzir à consciência acerca das coisas. Podemos dizer que essa é a tarefa dos professores, dos educadores, cujas práticas têm como principal objectivo conduzir os seus alunos à reflexão e à crítica. Conforme é retratado no texto da alegoria da caverna, aquando do regresso do ex-prisioneiro, esses pedagogos têm, no entanto, de defrontar-se com várias dificuldades, que se caracterizam por uma enorme resistência aos ensinamentos e à mudança que lhes é anunciada. Isto sucede, porque o ser humano, muitas vezes, prefere viver iludido com uma realidade, que sente como segura, a esforçar-se em busca de um pensamento mais autónomo, mais consciente, mais livre.

Da alegoria da caverna podemos extrair a seguinte lição:
Existem duas alternativas possíveis ao ser humano:
Primeira: A escolha de uma vida inconsciente, que se baseia apenas na mera luta pela sobrevivência e na valorização das necessidades materiais, fazendo aquilo que a sociedade exige de nós.
Segunda: Ou a escolha de uma vida mais activa, mais livre, mais autónoma que não se contenta com a satisfação dos interesses imediatos, em que o esforço para investigar a verdadeira natureza das coisas é uma constante. Só esta alternativa de vida faz jus à célebre frase de Sócrates: “Uma vida não examinada não merece ser vivida.”- Porque tendo nós a capacidade de reflectir e de nos tornarmos mais conscientes, a decisão de não examinar a realidade e, portanto, não usufruir dessa capacidade é como que uma rejeição de uma das partes mais importantes da nossa vida e do nosso ser.

14/10/2009

O que é argumentar?

TEXTO 3
O que é argumentar?
                «Algumas pessoas pensam que argumentar é apenas expor os seus preconceitos de uma forma nova. É por isso que muita gente considera que argumentar é desagradável e inútil, confundindo argumentar com discutir. Dizemos por vezes que discutir é uma espécie de luta verbal. Contudo, argumentar não é nada disso.
                […] “Argumentar” quer dizer oferecer um conjunto de razões a favor de uma conclusão ou oferecer dados favoráveis a uma conclusão. […] Argumentar não é apenas a afirmação de determinado ponto de vista nem uma discussão. Os argumentos são tentativas de sustentar certos pontos de vista com razões. Neste sentido, os argumentos não são inúteis; na verdade, são essenciais.
                Os argumentos são essenciais, em primeiro lugar, porque constituem uma forma de tentarmos descobrir quais os melhores pontos de vista. Nem todos os pontos de vista são iguais. Algumas conclusões podem ser defendidas com boas razões e outras com razões menos boas. No entanto, não sabemos na maioria das vezes quais são as melhores conclusões. Precisamos, por isso, de apresentar argumentos para sustentar diferentes conclusões e, depois, avaliar tais argumentos para ver se são realmente bons.
                Neste sentido, um argumento é uma forma de investigação. Alguns filósofos e activistas argumentaram, por exemplo, que criar animais só para produzir carne causa um sofrimento imenso aos animais e que portanto é injustificado e imoral. Será que têm razão? Não podemos decidir consultando os nossos preconceitos. Estão envolvidas muitas questões. Por exemplo, temos obrigações orais para com outras espécies ou o sofrimento humano é o único realmente mau? Podem os seres humanos viver realmente bem sem carne? Alguns vegetarianos vivem até idades muito avançadas. Será que este facto mostra que as dietas vegetarianas são mais saudáveis? Ou será irrelevante, tendo em conta que alguns não vegetarianos também vivem até idades muito avançadas? (É melhor perguntarmos se há uma percentagem mais elevada de vegetarianos que vivem até idades avançadas.) Terão as pessoas mais saudáveis tendência para se tornarem vegetarianas, ao contrário das outras? Todas estas questões têm de ser apreciadas cuidadosamente, e as respostas não são, à partida, óbvias.
                Os argumentos também são essenciais por outra razão. Uma vez chegados a uma conclusão baseada em boas razões, os argumentos são a forma pela qual a explicamos e defendemos. Um bom argumento não se limita a repetir as conclusões. Em vez disso oferece razões e dados suficientes para que as outras pessoas possam formar a sua própria opinião. Se o leitor ficar convencido que devemos realmente mudar a forma como criamos e usamos os animais, por exemplo, terá de usar argumentos para explicar como chegou a essa conclusão: é assim que convencerá as outras pessoas. Ofereça as razões e os dados que o convenceram a si. Ter opiniões fortes não é um erro. O erro é não ter mais nada.»

A. WESTON,  A arte de argumentar, Lisboa, Gradiva, 1996, 13-15

A especificidade da Filosofia

TEXTO 1
«Por volta dos 14 anos muitas pessoas começam a pensar por si próprias em problemas filosóficos – sobre o que realmente existe, se podemos saber alguma coisa, se alguma coisa está realmente certa ou errada, se a vida faz sentido, se a morte é o fim. Escreve-se acerca destes problemas desde há milhares de anos, mas a matéria-prima filosófica vem directamente do mundo e da nossa relação com ele e não de escritos do passado. É por isso que continuam a surgir uma e outra vez na cabeça de pessoas que não leram nada acerca deles. […]
A filosofia é diferente da ciência e da matemática. Ao contrário da ciência, não assenta em experimentações nem na observação, mas apenas no pensamento. E, ao contrário da matemática, não tem métodos formais de prova. A filosofia faz-se colocando questões, argumentando, ensaiando ideias e pensando em argumentos possíveis contra elas e procurando saber como funcionam realmente os nossos conceitos.
A preocupação fundamental da filosofia consiste em questionar e compreendermos ideias muito comuns que usamos todos os dias sem pensarmos nelas. Um historiador pode perguntar o que aconteceu em determinado momento do passado, mas um filósofo perguntará: «O que é o tempo?». Um matemático pode investigar as relações entre os números, mas um filósofo perguntará: «O que é um número?». Um físico perguntará de que são constituídos os átomos ou o que explica a gravidade, mas um filósofo irá perguntar como sabemos que existe qualquer coisa fora das nossas mentes. Um psicólogo pode investigar como é que as crianças aprendem uma linguagem, mas um filósofo perguntará: «Que faz uma palavra significar qualquer coisa?» Qualquer pessoa pode perguntar se entrar num cinema está errado, mas um filósofo perguntará: «O que torna uma acção certa ou errada?».
Não poderíamos viver sem tomarmos como garantidas as ideias do tempo, número, conhecimento, linguagem, certo e errado, a maior parte do tempo, mas em filosofia investigamos essas mesmas coisas. O objectivo é levar o conhecimento do mundo e de nós um pouco mais longe. É óbvio que não é fácil. Quanto mais básicas são as ideias que tentamos investigar, menos instrumentos temos para nos ajudarem. Não há muitas coisas que possamos assumir como verdadeiras ou tomar como garantidas. Por isso, a filosofia é uma actividade de certa forma vertiginosa, e poucos dos seus resultados ficam por desafiar por muito tempo.»
Thomas Nagel, O que quer dizer tudo isto?, p. 8-9


TEXTO 2
«Se alguém me perguntar quando é a maré-cheia, sei como fazer para obter uma resposta. Há tabelas fidedignas que posso consultar. Posso ter uma ideia de como se fazem essas tabelas. E se tudo o resto falhar, eu próprio posso ir medir as marés. Uma pergunta deste género refere-se à experiência: é uma pergunta empírica. […] As perguntas dos filósofos não são assim. Parecem exigir mais reflexão. […] O que será que me poderia mostrar, por exemplo, que eu não sou, afinal, um fantoche, programado para fazer as coisas que penso fazer livremente?»
Simon Blackburn, Pense – uma Introdução à Filosofia