14/10/2009

A especificidade da Filosofia

TEXTO 1
«Por volta dos 14 anos muitas pessoas começam a pensar por si próprias em problemas filosóficos – sobre o que realmente existe, se podemos saber alguma coisa, se alguma coisa está realmente certa ou errada, se a vida faz sentido, se a morte é o fim. Escreve-se acerca destes problemas desde há milhares de anos, mas a matéria-prima filosófica vem directamente do mundo e da nossa relação com ele e não de escritos do passado. É por isso que continuam a surgir uma e outra vez na cabeça de pessoas que não leram nada acerca deles. […]
A filosofia é diferente da ciência e da matemática. Ao contrário da ciência, não assenta em experimentações nem na observação, mas apenas no pensamento. E, ao contrário da matemática, não tem métodos formais de prova. A filosofia faz-se colocando questões, argumentando, ensaiando ideias e pensando em argumentos possíveis contra elas e procurando saber como funcionam realmente os nossos conceitos.
A preocupação fundamental da filosofia consiste em questionar e compreendermos ideias muito comuns que usamos todos os dias sem pensarmos nelas. Um historiador pode perguntar o que aconteceu em determinado momento do passado, mas um filósofo perguntará: «O que é o tempo?». Um matemático pode investigar as relações entre os números, mas um filósofo perguntará: «O que é um número?». Um físico perguntará de que são constituídos os átomos ou o que explica a gravidade, mas um filósofo irá perguntar como sabemos que existe qualquer coisa fora das nossas mentes. Um psicólogo pode investigar como é que as crianças aprendem uma linguagem, mas um filósofo perguntará: «Que faz uma palavra significar qualquer coisa?» Qualquer pessoa pode perguntar se entrar num cinema está errado, mas um filósofo perguntará: «O que torna uma acção certa ou errada?».
Não poderíamos viver sem tomarmos como garantidas as ideias do tempo, número, conhecimento, linguagem, certo e errado, a maior parte do tempo, mas em filosofia investigamos essas mesmas coisas. O objectivo é levar o conhecimento do mundo e de nós um pouco mais longe. É óbvio que não é fácil. Quanto mais básicas são as ideias que tentamos investigar, menos instrumentos temos para nos ajudarem. Não há muitas coisas que possamos assumir como verdadeiras ou tomar como garantidas. Por isso, a filosofia é uma actividade de certa forma vertiginosa, e poucos dos seus resultados ficam por desafiar por muito tempo.»
Thomas Nagel, O que quer dizer tudo isto?, p. 8-9


TEXTO 2
«Se alguém me perguntar quando é a maré-cheia, sei como fazer para obter uma resposta. Há tabelas fidedignas que posso consultar. Posso ter uma ideia de como se fazem essas tabelas. E se tudo o resto falhar, eu próprio posso ir medir as marés. Uma pergunta deste género refere-se à experiência: é uma pergunta empírica. […] As perguntas dos filósofos não são assim. Parecem exigir mais reflexão. […] O que será que me poderia mostrar, por exemplo, que eu não sou, afinal, um fantoche, programado para fazer as coisas que penso fazer livremente?»
Simon Blackburn, Pense – uma Introdução à Filosofia


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